Entre lustres e
móveis históricos do Palácio Pedro Ernesto, 11 manifestantes completaram
nesta sexta-feira (16) uma semana de ocupação na Câmara Municipal do
Rio. Com uma lista de nove reivindicações, o grupo diz estar aberto a
negociá-las para deixar o prédio. Já a Câmara reafirmou que não tem como
atendê-las.
Os manifestantes não revelam nomes nem fornecem
informações pessoais como endereço, ocupação e idade para não
"individualizarem o movimento". E pedem para serem chamados de Amarildo,
em referência ao ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, desaparecido
desde o dia 14 de julho após ter sido levado por policiais militares
para averiguação na Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Rocinha. Os
manifestantes são mantidos à base de doações que são entregues aos que
estão fora da Casa, grupo maior que está desde a primeira sessão da
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Ônibus, acampado nas
escadarias e na Cinelândia. No grupo dentro da Câmara, há um voluntário
da Mídia Ninja.
"Nossa ideia é não permitir nenhuma mitificação ou
glorificação dos nossos nomes. Algumas pessoas passam lá fora e gritam
que somos heróis. É isso que não queremos. Nem de longe somos isso",
explicou um jovem manifestante, que se identificou como Amarildo de
Santa Cruz.
O
grupo pede que a comissão seja reformulada, com a saída de quatro
vereadores que a integram, mas foram contra sua criação. São eles:
Chiquinho Brazão (PMDB), o presidente; Jorginho da SOS (PMDB); Renato
Moura (PTC) e Professor Uóston (PMDB), o relator. Outro pedido dos
manifestantes é que o vereador Eliomar Coelho (PSOL), proponente da CPI,
seja o presidente. Eles reivindicam ainda que todas as reuniões sejam
amplamente divulgadas e feitas em locais com participação popular
irrestrita, que o regimento da Câmara seja mudado para permitir
manifestações dentro da Casa e que uma possível desocupação ocorra
respeitando a integridade física dos participantes.
"O que a gente garante é que se todas as pautas forem cumpridas, a gente sai. Mas estamos abertos a negociações", disse o jovem.
Para
conceder entrevista, o grupo debateu por cerca de 30 minutos e escolheu
dois porta-vozes. Para fazer as fotos, foram mais alguns minutos de
reunião. Desde o início da ocupação, as discussões têm feito parte da
rotina de quem está acampado dentro e fora da Câmara.
"Lá fora,
eles fazem a abertura e o fechamento do dia, com discussões às 8h e às
22h, e grupos de trabalho temáticos. Tem gente que cuida da segurança,
da alimentação, do almoxarifado, para ver os cartazes e essas coisas, e
da comunicação, atualizando nossa página no Facebook. Aqui dentro, a
gente senta e discute quando surge uma demanda", conta outro jovem, que
se identificou como Amarildo de Bangu.
A permanência da ocupação
foi tema de exaustivas discussões até a noite de sábado, quando a
maioria dos mais de 40 que haviam dormido na Câmara de sexta para sábado
decidiu sair, depois de quatro horas de debate. Quinze continuaram,
número que foi diminuindo ao longo da semana. Chão frio, colchonetes
finos, falta de chuveiros e impossibilidade de um "banho de sol" são as
principais dificuldades relatadas pelos manifestantes.
"Mas o que
nos cansa mais é o diálogo não avançar. Se estivéssemos com todas as
dificuldades práticas, mas tendo um diálogo construtivo, nos sentiríamos
melhor. E tem também a expectativa de que a qualquer momento podem
tentar nos tirar daqui", diz uma manifestante, contando que um esquema
de vigilância foi organizado durante a noite, com o rodízio de quem
ficará acordado. Segundo eles, além de policiais e guardas internos da
Câmara, seguranças particulares dos vereadores também circularam pelo
prédio nos últimos sete dias.
A página do movimento no Facebook, a
"Ocupa Câmara Rio", tem mais de 3,2 mil seguidores, e é usada para
divulgar as reivindicações e pedir doações de comida, cobertor e
colchonete, entre outros itens. De acordo com outra manifestante, que
prefere ser chamada de Amarildo e estava do lado de fora da Câmara, as
doações chegam em dinheiro, refeições e lanches. "Muita gente que
trabalha aqui no centro vem para ajudar. Quem vai para casa todos os
dias também traz bolsas e evita comer aqui, para economizar".
Lanches
como pães e biscoitos são as principais refeições. Entre os
integrantes, há dois veganos, que não comem nada de origem animal, e
três vegetarianos, que têm mantido a dieta com a ajuda das doações.
Do
lado de fora da Câmara, 15 barracas, duas tendas e três lonas abrigam
os manifestantes. Cartazes com diversas bandeiras fazem um mosaico de
reivindicações – contra a corrupção, pedidos de renúncia do governador
Sérgio Cabral, questionamentos sobre onde está Amarildo, além de pautas
feministas, rejeições aos leilões de petróleo, críticas às remoções no
Jardim Botânico e defesa dos direitos dos taxistas, camelôs e animais.
Por
meio de nota divulgada pela assessoria de comunicação, a Câmara
Municipal reafirmou que não tem como atender às demandas dos
manifestantes que ocupam o Palácio Pedro Ernesto, “por representarem
prática de ilegalidade e descumprimento do que estabelece a legislação
em vigor – o regimento interno, a Lei Orgânica Municipal e a
Constituição Federal”.
O posicionamento da Câmara é o mesmo
apresentado pelo presidente da Casa, vereador Jorge Felippe (PMDB),
durante reunião no sábado passado (10) com a comissão de manifestantes.
Dos cinco itens da pauta de reivindicações, o único que Jorge Felippe
informou que poderá atender é o que trata da programação e divulgação
com antecedência de todas as reuniões da Câmara, além da garantia de
participação popular irrestrita nas sessões.
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