Farta da violência, população vê com ceticismo Exército nas ruas do Rio
AFP / Mauro PIMENTELProteção reforçada no entorno do Museu do Amanhã, na zona portuária do Rio, em 29 de julho de 2017
Tropas militares vigiavam as principais vias de acesso ao Rio de Janeiro, neste sábado (29), após o lançamento do Plano de Segurança do Rio, uma operação contra o crime organizado que também terá de vencer o ceticismo de uma população saturada da violência.
O envio de uma força de 10 mil agentes federais, entre eles 8.500 militares, foi autorizado ontem (28) pelo presidente Michel Temer e deve durar até o final de 2018.
Neste sábado, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, reiterou que o objetivo da "Operação Segurança e Paz" é "chegar ao comando, aos arsenais [do tráfico de drogas]", em vez de provocar um "efeito inibidor" de apenas alguns dias, ou semanas.
"Estamos fazendo um reconhecimento em áreas e microáreas que serão fundamentais para ações futuras", declarou Jungmann, em entrevista coletiva.
Os agentes terão, principalmente, tarefas de Inteligência e farão operações surpresa, descartando ações ostensivas como a ocupação de favelas controladas por traficantes.
Hoje, as tropas se concentravam, em especial, na Baixada Fluminense, nos arredores do Aeroporto Internacional do Galeão e na Zona Oeste. Também havia soldados espalhados pela praia de Ipanema, na Zona Sul do Rio, e em frente ao Museu do Amanhã, na zona portuária.
A imprensa local relata que alguns motoristas manifestaram, com buzinaços, sua satisfação de ver militares assumindo a segurança das ruas. A mobilização e a ostentação de armas assustava muitos turistas, porém, que pediam explicações sobre o que está acontecendo na cidade.
Os militares já intervieram em outras ocasiões pontuais, como na Copa do Mundo de 2014 e nas Olimpíadas, em 2016.
AFP / Mauro PIMENTELMilitares fazem patrulha na praia de Ipanema, no Rio, em 29 de julho de 2017
Esse envio de tropas foi feito, inicialmente, em coordenação com projetos de integração urbana e social das favelas e com a instalação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) em comunidades. Esses programas se viram afetados pela crise do Estado do Rio, à beira da falência, e pela recessão econômica do país.
- Solução: aceitação e projetos sociais -
Com esses precedentes, é grande o ceticismo na população sobre as chances de sucesso da nova campanha.
"Só o futuro dirá", afirma João, atendente de um café de Copacabana, enquanto olha na televisão os blindados instalados na Linha Vermelha.
"Não vai dar nada, como sempre", comenta, resignado, o motorista de aplicativo de transporte urbano Emerson Silva.
Para o editor do site especializado DefesaNet, Nelson Düring, "tudo depende de como será a reação da sociedade e dos governos aos primeiros confrontos".
"Segurança e Paz" se propões "a ir além da operação dos Jogos", concentrada em "conter a criminalidade", disse Düring à AFP.
Agora, completou, o objetivo é "começar a desarticular as gangues. Isso realmente pode ser bastante traumático".
Atingir as "cadeias de comando" do tráfico de drogas "pode ser uma 'Lava Jato' do crime. A cabeça não está no morro, está na beira da praia. O menino de 15, 16 anos com um fuzil não representa nada. O problema é quem está acima dele".
Outro aspecto diz respeito ao investimento social. "De nada adianta ter militares nas ruas, se o Estado não chega com projetos de saúde e educação", conclui Düring.
Já o escritor Anderson França, um cronista da violência no Rio muito seguido nas redes sociais, acredita que "a chegada dos militares não resolve nada".
"Estamos trazendo militares para uma cidade totalmente desgovernada, sem discutir as causas, pelas quais está desgovernada", advertiu o autor do livro "Rio em shamas", em conversa por telefone com a AFP na sexta-feira à noite.
"Acho que é uma prática de diversionismo", avaliou França sobre o presidente Temer, que registra apenas 5% de aprovação de seu governo, o pior desde a redemocratização no país.
"Eu não acho que ele faça isso porque ele está preocupado com o estado de segurança no Rio de Janeiro... Esse governo não se estabelece pautado em preocupações de ordem social", considerou o escritor, referindo-se à política de ajustes promovida por Temer e pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.
A socióloga Sílvia Ramos, do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes, comentou que "o Rio vive uma crise estrutural e crise aguda" e, em entrevista à rádio CBN, ela disse se questionar se "esse impacto cenográfico vai ter um impacto estrutural".
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