quarta-feira, 17 de novembro de 2021

 

Como criar filhos com superpoderes?

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*por Claudia Queiroz

É inquestionável o fato da Mulher Maravilha exercer tanto fascínio em nossas vidas. Minha filha, de 5 anos, está na fase de idolatrar a heroína. Começamos a assistir aos filmes juntas e estou aproveitando para explicar os motivos pelo qual essa personagem é tão especial na educação e no imaginário das crianças.

Uma garota educada para não trapacear, porque erguer um troféu sem vencer todas as etapas de um desafio não tem valor algum… Essa lição impacta logo de início na trama e traz a importância da frustração no quesito “como preparar um filho para o mundo”. A pequena Diana, deitada no colo da mãe, chorando… Ela havia ganho a prova pegando um atalho durante a disputa, e mãe sabia disso e não permitiu que ela vencesse.

Enquanto as lágrimas corriam pelo rosto da menina, a mãe oferecia colo. Aliás, é o que as mães devem fazer sempre, enquanto conduzem e orientam seus filhos. Como importa a presença da mãe nesta construção! Sem gritos, palmadas, castigos… Afinal, a verdade se impõe por ela mesma. Ganhou, mas não levou; perdeu porque errou; está triste, mas vai passar; feliz, isso também acaba…

Foi na maternidade que desenvolvi olhos ainda mais potentes, capazes de enxergar longe, inclusive aquilo que parece invisível para a maioria de nós. Esse é o trunfo da sabedoria de ser mulher e poder moldar alguém para trilhar os destinos da própria história.

Como vou imprimir na minha filha a linguagem de amor que ela merece receber, se não for tratada com respeito desde sempre? Quando que gritar, bater ou punir fez alguém se sentir potente para enfrentar seus próprios dilemas? Pelo que sei, adestramos animais selvagens com essas técnicas de recompensa e punição. Mas crianças merecem um olhar carinhoso. Elas são apenas pessoas pequenas. E carregando uma educação tradicional (a que recebemos), cheias de limites, falta de paciência, intolerância, violências e etc, os poderes especiais que elas têm direito de desenvolver ficarão distantes delas. Assim como em muitos de nós, que nos afastamos tanto da própria essência que passamos boa parte da vida adulta revendo situações mal resolvidas por falta de base.

Esta é a palavra-chave: Base. É na falta dela onde nascem os vilões. Coringa, Cruela, Doutora Veneno e tantos outros, surgiram da desorientação das emoções. Mágoas, traumas, ressentimentos, inveja, bullying, perdas, dentre inúmeras situações experimentadas na infância. Hoje sei que tudo o que uma criança interpreta vira verdade para ela, especialmente no que sente e acredita. Mais tarde, aciona gatilhos emocionais e descarrega a carga de toda uma vida em situações que parecem tolas, mas que trazem memórias perturbadoras.

Com o coração apertado e escondendo indefinidamente as dores de uma criança invisível ferida, essas pessoas sofrem, mas escolhem fazer o mal por vingança.  Apesar da justificativa, mal será sempre mal e bem, sempre bem (super clichê, só que acredito nisso).

Ontem mostrei para minha filha um paredão com meninos de rua sendo inspecionado pela polícia, próximo a um shopping de Curitiba, cidade onde moramos. Expliquei que eles deviam ter roubado algo, usado drogas ou feito mal a alguém. Ela arregalou os olhos assustada. Aproveitei para dizer que provavelmente eles sentiam inveja de um amiguinho quando eram pequenos e precisavam roubar para ter o que não podiam comprar. Inveja não é um sentimento bom. Devemos nos alegrar quando um amigo está feliz, certo? Cabe aos educadores destas crianças perceberem esses brotinhos de erva-daninha nascendo para fazerem a poda na hora certa.

Ninguém nasce bandido. As escolhas de vida conduzem a realidade para esse fim. Mas precisamos cuidar das nossas crianças para que elas compreendam o potencial de acolher todas as emoções que vierem com a orientação de um adulto preparado para interpretar e cuidar da digestão de todas elas.

Sempre me lembro que Madre Tereza dizia que para mudar o mundo era preciso olhar para nossos filhos. Isso transforma realidades. São os laços mágicos que pronunciam verdades, protegem vulneráveis e fortalecem a empatia.

Toda história de super-herói traz valores essenciais para o ser humano. São sempre inspiradoras. Ainda mais quando educamos crianças que acreditam que podem tudo. E podem. Porque a ingenuidade da infância carrega a esperança por dias melhores. Mulher Maravilha imprime implicitamente a expressão “Lute como uma garota”, mostrando que mais do que força é preciso ter habilidade para dar piruetas, driblar problemas e saber vencer na vida. Não se limita a apenas força física, mas na dualidade entre a inteligência emocional com a atitude correta para agir. Indica uma nova geração de heróis que estamos lapidando. Lembrando, que o maior laboratório da infância fica em casa. É ali onde fabricamos todos os superpoderes.

Claudia Queiroz é jornalista.

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