Campeões de royalties investem
mais em saúde sem resultados
De olho nessa lacuna e na perspectiva de que cada vez mais dinheiro jorrará para os cofres públicos com os desdobramentos da exploração da camada do pré-sal, a saúde pública é um dos temas mais quentes do debate eleitoral em Campos, cidade dominada pela família Garotinho, e Macaé, cuja administração atual é alinhada ao governador Sérgio Cabral (PMDB).
Nas duas cidades, os médicos estão em quase todas as principais chapas. Em Campos, os dois principais oposicionistas à prefeita Rosinha Garotinho (PR), candidata à reeleição e líder nas pesquisas com 62% das intenções de voto, são os médicos Arnaldo Vianna (PDT) e Makhoul Mussallem. Ambos têm 11% na corrida eleitoral, segundo pesquisa Ibope divulgada no dia 18 de setembro, e tentam desbancar a rica administração da mulher do ex-governador e deputado federal Anthony Garotinho (PMDB) e seu vice, o médico Dr. Chicão.
Em Macaé, o líder nas pesquisas, Aluizio dos Santos Júnior (PV), é um neurologista cuja reputação rivaliza com a do vice na chapa do PSD, o ex-secretário municipal de Saúde da cidade, Pedro Reis. O candidato do PV tem 63% das intenções de voto segundo pesquisa Ibope de 2 de setembro.
Inicialmente impedida de disputar a reeleição em Campos por problemas com a Lei da Ficha Limpa, Rosinha faz campanha munida de uma liminar favorável do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Com o argumento de ser uma das autoridades municipais que mais investem em saúde em todo o país, a prefeita e candidata à reeleição tem uma extensa lista de promessas para o setor, boa parte delas concentradas na construção de novas unidades básicas de saúde (UBSs) e em obras e ampliações dos hospitais da cidade.
Impulsionada pelo dinheiro dos royalties, Campos destinou 38% de suas receitas para a área de saúde em 2011 - pela Constituição, municípios têm obrigação de investir 15% da arrecadação no setor; Estados, 12%. Apesar dos altos valores investidos, Campos recebeu nota 5,3 no Índice de Desempenho do Sistema Único de Saúde (Idsus), ficando com a 17ª posição estadual e abaixo da média nacional (5,47). Além disso, os indicadores de mortalidade infantil e saneamento básico do município, o maior da região norte do Rio, são considerados péssimos: apenas 50% das residências têm saneamento adequado e o índice de óbitos por mil nascimentos é de 19,55, bem acima da taxa média do Estado (13,95) e da brasileira (13,85).
A contradição entre a riqueza proporcionada pelo petróleo e as deficiências do sistema de saúde virou arma de campanha tanto dos adversários de Rosinha em Campos como na disputa eleitoral na vizinha Macaé.
Em Campos, Arnaldo Vianna, do PDT, aparece na propaganda eleitoral vestido com jaleco branco e estetoscópio em volta do pescoço se autoproclamando o defensor do dinheiro do petróleo para melhorar a saúde. "Eu fui o maior defensor dos royalties para Campos. Graças a isso, nosso orçamento passou de R$ 600 milhões para R$ 2 bilhões. Com os royalties vou ampliar o Programa Saúde da Família e construir os Hospitais da Baixada e da Criança", promete Vianna.
Ex-diretor do maior hospital de Campos, o candidato petista Makhoul Mussallem destaca a falta de leitos na cidade para acusar o governo de aproveitar mal os recursos dos royalties para a área médica. "Acho que para um município com a renda dos royalties do petróleo é um absurdo não se fazer leitos suficientes para atender a demanda", critica. Além disso, Mussallem questiona a falta de parceria da prefeita Rosinha com o governador Sérgio Cabral. "Há duas semanas o vice-governador veio inaugurar oito novos leitos de UTI no hospital Álvaro Alvim porque eu pedi para o governador, e ele cedeu de imediato."
A cidade de Campos nada contra a corrente no Rio ao não usar recursos estaduais na saúde. "Quem sofre é a população. Não interessa se Cabral e Garotinho não se dão bem. A população não tem culpa pela briga política", diz Reinaldo Dantas, presidente do Sindicato dos Médicos de Campos (Simec).
O secretário municipal de Saúde, Geraldo Venâncio, diz que a cidade tem condições de cuidar da saúde sozinha, não precisa do Estado e classifica o governo estadual como "um mero repassador de recursos federais, na maior parte das vezes". Sobre a falta de leitos, Venâncio argumenta que 30% dos pacientes atendidos no sistema municipal vêm de municípios vizinhos e que boa parte dos recursos dos royalties é usado para bancar a operação terceirizada de quatro dos seis grandes hospitais da cidade. "A contratualização dos hospitais só existe porque temos os royalties", afirma o secretário de Saúde de Rosinha.
Em Macaé, a administração municipal gastou no ano passado 22,7% das receitas próprias com saúde, o equivalente a cerca de R$ 255 milhões. O investimento, maior do que os 15% exigidos pela Constituição, é elevado, mas a segunda maior cidade da região norte do Rio teve nota baixa no Idsus, de 4,5 pontos. Além da arrecadação de impostos, o prefeito Riverton Mussi (PMDB) tem à disposição mais de R$ 500 milhões por ano em royalties do petróleo, dinheiro pouco aproveitado para mudar a situação dramática do saneamento básico. O percentual de domicílios com saneamento adequado caiu de 78% para 70% entre 2000 e 2010 e mais de 90% de todo o esgoto da cidade é jogado in natura no rio Macaé e no mar, onde flutuam dezenas de plataformas de extração de petróleo da Petrobras.
Líder nas pesquisas, o Dr. Aluizio é crítico da gestão dos recursos do petróleo e propõe usar essa fonte de receita para investimentos em saúde, saneamento e tratamento de água. "Macaé tem um orçamento de R$ 1,5 bilhão. A questão é priorizar." Se eleito, o candidato do PV promete investir R$ 450 milhões para universalizar o saneamento e a distribuição de água encanada. Segundo Dr. Aluizio, 65% das internações de crianças em Macaé são relacionadas à precariedade do saneamento básico.
Mesmo apoiado pelo prefeito de Macaé, o veterinário Christino Áureo (PSD) também critica a gestão da saúde e promete gastar bastante dinheiro do petróleo. Com 17% das intenções de voto, segundo o Ibope, o candidato quer levar o Programa Saúde da Família para 100% da população de Macaé a um custo de R$ 750 milhões. Nas suas contas, universalizar o saneamento no município levará dez anos e custará cerca de R$ 2 bilhões. "Saneamento é saúde", resume.
Jornal "Valor Economico"
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