O Visconde de Araruama, o seu palacete na praça, e o Canal Campos Macaé
José Carneiro da Silva: o Visconde de Araruama e suas atividades no “País Fertilíssimo da Província do Rio de Janeiro”
Por: Graziela Escocard – Diretora do Museu Histórico de Campos dos Goytacazes e Colaboradora da Enciclopédia Campista.
O visconde herdou o emblemático sobrado pertencente a seu tio José Caetano Barcelos Coutinho, situado na Praça São Salvador da Cidade de Campos, RJ, onde residiu com sua esposa Francisca Antônia Ribeiro de Castro, nascida em 24 de março de 1799, filha do Capitão-mor Manuel Antônio Ribeiro de Castro, primeiro Barão de Santa Rita, e de Ana Francisca Pinheiro.
Considerado um grande proprietário rural de sua época, devido às propriedades que adquiriu por meio de herança e empreendimentos introduzidos nos município de Quissamã e Campos, possuía todos os predicados de um chefe político regional como demonstra os títulos com que foi agraciado, representativos da boa reputação que conseguiu alcançar.
Desde 1811 serviu nas Milícias, obtendo, em 1820, o posto de Tenente-Coronel de Milícias de Campos dos Goytacazes, atuou na Guarda Nacional do Rio de Janeiro de 1841 a 1860, quando foi exonerado a pedido. Exerceu ainda o cargo de Comandante Superior da Guarda Nacional em Macaé e Capivari (atual Silva Jardim) entre 1852 a 1856. Atuou também como Juiz Municipal, Delegado de Polícia e Juiz de Paz em Quissamã. Recebeu as condecorações de Grande do Império, Comendador da Imperial Ordem da Rosa e Fidalgo-Cavaleiro da Casa Imperial. Fez parte da Assembleia Legislativa Provincial do Rio de Janeiro, como membro do partido Conservador, em várias ocasiões. Sua primeira legislatura se deu em 1835 até 1837, sendo a segunda em 1838 a 1839, e a terceira em 1844. Por ser eleito diversas vezes deputado para Assembleia Legislativa, hasteando a bandeira do partido Conservador, tornou-se muito influente na corte, pois era o líder político de uma das regiões mais prósperas do país.
Já as honrarias de Barão e de Visconde, que foram as mais difundidas, foram agraciadas em 5 de maio de 1844, através de um decreto imperial que lhe conferiu o título de 1º Barão de Araruama, e três anos depois, outro decreto imperial, em 15 de abril de 1847, concede o título de 1º Visconde, com grandeza, de Araruama7. Sendo este título conferido por Decreto, registrado no Livro de Registro de Leis, Alvarás e Cartas, Vol. 8, folha 155, sob a guarda do Arquivo Nacional, códice 528.
Segundo a descrição de sua heráldica, o brasão do Visconde de Araruama é composto por um escudo de armas esquartelado. No primeiro quartel, em campo de goles, um castelo com sua muralha e torre; e firmados em chefe, quatro escudetes: ao primeiro em campo azul, uma flor de lis de prata e bordadura de ouro; ao segundo e quarto de azul, cinco besantes de prata postos em santor; e ao terceiro em campo de azul, uma aspa de goles. No segundo quartel, as armas dos Carneiros: em campo vermelho, uma banda de azul coticada de ouro e carregada de três flores de Lis do mesmo metal entre dois carneiros de prata passantes armados de ouro. No terceiro quartel as armas dos Silvas: em campo de prata, um leão de goles, rompente, armado de azul. No último quartel, as armas dos Coutinho: em campo de ouro, cinco estrelas de vermelho com cinco raios postos em aspa. Coroa: a de conde. Timbre: um dos carneiros das armas.
Embora tenha recebido somente a educação basilar, o que era comum para a época em que viveu, tornou-se conhecido no meio intelectual do Rio de Janeiro como um homem instruído. Atraído pela curiosidade científica, procurou se aprofundar de conhecimentos voltados para a filosofia, história e geografia, se tornando sócio fundador do Imperial Instituto Fluminense de Agricultura e da Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional, além de ter sido sócio correspondente do Instituto Histórico de Paris.
No ano de 1844, lançou sua obra mais famosa, a “Memória Topográfica e Histórica sobre os Campos dos Goytacazes com uma Notícia Breve de suas Produções e Comérci”o, publicada em 1819, sendo sua segunda edição lançada em 1907. No século XXI, sua obra ainda é empregada como fonte de pesquisa respeitável, acarretando na sua terceira edição, em 2010. Nesta obra expõe suas observações importantes sobre a sociedade e natureza do “País Fertilíssimo da Província do Rio de Janeiro”, em que vivia, especialmente, sobre o Rio Paraíba do Sul e a Lagoa Feia, revelando ser uma pessoa que se interessa pelo ofício do comércio e pelas novidades tecnológicas.
A “Memória sobre a Abertura de um Novo Canal para Facilitar a Comunicação entre a Cidade de Campos e a Vila de São João de Macaé” foi publicada em 1836. O que lhe foi favorecido a conseguir em 1837 a aprovação pelo governo provincial de sua proposta de construção de um canal que permitisse o transporte de açúcar de Campos dos Goytacazes até o Porto de Imbetiba em Macaé.
O comércio marítimo na Província fluminense durante muitos anos preocupou as autoridades e os moradores progressistas dos municípios de Campos e Macaé. Dentre estes se destacou o José Carneiro da Silva, o Visconde de Araruama que foi um dos maiores incentivadores.
Entretanto, segundo Arthur Soffiati (2005), o bispo José Joaquim da Cunha de Azevedo Coutinho foi, ao que parece, o primeiro a recomendar a construção do canal Campos – Macaé, esboçada no livro: Ensaio Econômico sobre o Comércio de Portugal e Colônias, publicado em 1618. Nesta obra o bispo descreve a planície do norte fluminense, cortada de rios e da possibilidade de se fazer um canal navegável.
Mas a grandiosa obra se inicia oficialmente em 1º de outubro de 1844, que durou até 1861, tendo o José Caetano da Silva como responsável pela empreitada. O canal apresentava a extensão de 105 quilômetros e foi construído com mão escrava. Seu principal objetivo era escoar os produtos da lavoura, transportar passageiros, além de diminuir doenças existentes na região, devido a possuir muitos lagos e pântanos.
Finalmente o canal foi inaugurado em 1861, interligando as bacias do Paraíba do Sul, da Lagoa Feia e do Macaé. No entanto, a construção da estrada de ferro Campos – Macaé tomou a função do canal Campos – Macaé anos depois. Hoje, ainda se fala no valão, isto é, o que restou do histórico canal Campos – Macaé, idealizado pelo Visconde de Araruama.
Outra obra que lhe é atribuída é a “Memória sobre o Comércio dos Escravos, em que Pretende Mostrar que este Tráfico é, para eles, antes um Bem do que um Mal”, lançada em 1838, tratando-se de um ensaio anônimo, trazendo como única pista do autor a referência que era natural dos Campos dos Goytacazes. Por muito tempo a historiografia considerava o bispo José Joaquim da Cunha de Azevedo Coutinho, nascido em Campos, como autor. Todavia a historiografia atual aponta que é mais plausível que José Carneiro da Silva, o tal Visconde de Araruama, tenha sido o verdadeiro autor desta obra, em face de sua trajetória biográfica.
Nas biografias consultadas sobre a vida e obra do Visconde de Araruama, se encontra numerosos serviços prestados à sociedade campista, dentre eles a melhoria de estradas na região, construção do Canal Campos – Macaé, e reconstrução da Igreja Matriz de Campos, junto com seu genro João de Almeida Pereira Filho, inaugurada no dia 22 de junho de 1862. E ao amparar a Santa Casa de Misericórdia de Campos, quando carecia, recebeu o título de provedor honorário e perpétuo.
Segundo Alberto Lamego (1945) o honrado Visconde de Araruama veio a falecer em 3 de maio de 1864, aos 76 anos, com uma vida cheia de serviços . Após sua morte, a militância política e conservadora foi continuada pela sua família por meio de seu filho, o Conde de Araruama, Bento Carneiro da Silva, nomeado chefe regional do Partido Conservador e no genro João de Almeida Pereira Filho que, em 1861, foi designado ministro dos Negócios do Império e governador da província do Rio de Janeiro entre 1858 a 1859. Ao todo, o Visconde de Araruama e sua esposa tiveram 10 filhos, sendo 4 homens e 6 mulheres, que tiveram casamentos arranjados com filhos de outros fazendeiros poderosos da região, ou com políticos importantes da capital imperial, além de parentes consanguíneos, como forma de contribuir para o fortalecimento de seus projetos para a região. Nos quais se destacaram pelos seguintes títulos de nobreza: Bento Carneiro da Silva (1826-1891), 2º Visconde e único Conde de Araruama; Francisca de Vellasco Castro Carneiro Silveira da Motta (1832-1885), Baronesa de Vila Franca; Manuel Carneiro da Silva (1833-1894), 2º Barão de Ururaí e único Visconde de Ururaí; José Caetano Carneiro da Silva (1836-1925), Barão e Visconde de Quissamã; João José Carneiro da Silva (1839-1882), Barão de Monte Cedro.
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