quarta-feira, 21 de junho de 2017

Sobrevivente da Chapecoense lança livro: "Viva como se estivesse de partida"

AFP / Tercio TeixeiraO jornalista Rafael Henzel, no dia 20 de junho de 2017
Rafael Henzel está vivo por "milagre". Este jornalista é um dos seis sobreviventes do acidente aéreo que dizimou a Chapecoense e, com a clarividência de quem flertou com a morte, quer contagiar com sua vitalidade a todos que queiram escutá-lo e lê-lo.
"Viva como se estivesse de partida" é o convite que o o jornalista esportivo faz em seu livro de superação pessoal que, de maneira carinhosa e incansável, autografou na noite de terça-feira em seu lançamento, no Rio de Janeiro.
Na fila de espera, as emoções estavam à flor da pele. Poucos podiam conter as lágrimas ao conversar e abraçar um dos "heróis" da tragédia que comoveu o Brasil e o mundo.
Com impressionante serenidade, Rafael Henzel era quem consolava e reconfortava, uma por uma, cada pessoa que se aproximava.
"Eu estou aqui sempre humildemente para dizer que não podemos deixar a chama se apagar, eu preciso dizer que se tem que viver a vida a todo momento e, se as pessoas entenderem isso pela minha voz, ficaria muito satisfeito", explicou Henzel em entrevista à AFP.
Henzel tem poucas marcas visíveis do acidente que há sete meses acabou com o sonho da modesta Chapecoense e deixou 71 mortos. Uma cicatriz ao redor do olho direito é praticamente o único sinal de que estava dentro do avião boliviano que caiu sem combustível nas montanhas colombianas de Medellín.
Foi lá que Henzel renasceu, aos 43 anos.
"Eu sempre falo que tenho duas datas de nascimento. Eu sou brasileiro e sou colombiano. Foi um renascimento, sim, mas tenho que fazer valer este renascimento, não é apenas estar vivo", declarou o jornalista, narrador da rádio Oeste Capital, de Chapecó, Santa Catarina.
- Problemas "mínimos" -
AFP / Tercio TeixeiraO jornalista Rafael Henzel, no dia 20 de junho de 2017 
O livro de Rafael Henzel é, de fato, um poderoso hino à vida.
O jornalista fez um retrospectiva emocional dos últimos meses: desde a euforia que tomou conta dele pela primeira final internacional da Chapecoense, passando pela dor de perder dezenas de amigos, até o dia em que, internado na unidade de tratamento intensivo, percebeu que precisava decidir entre afogar em "sofrimento" ou mergulhar de cabeça na "recuperação".
Graças à força e orações enviadas por milhares de pessoas através das redes sociais, Henzel escolheu a segunda opção. Começou a fazer fisioterapia, até de madrugada, a escutar música alegre, a acreditar em si. E, 40 dias depois, estava de volta aos microfones para narrar a nova era da Chapecoense.
"Acho que meu otimismo me levou a viver", afirma.
Estar à beira da morte o fez ver a vida com outros olhos e, diante de um mundo acelerado e cada vez mais individualista, quis deixar por escrito o que aprendeu.
"Só uma coisa não tem solução, que é a morte. Muitas vezes os problemas são mínimos e a gente consegue transformá-los em problemas gigantes. Isso não leva a nada, as coisas pouco a pouco vão se ajustando", garante o jornalista.
Ficar mais tempo com a família, desfrutar dos amigos, relativizar os problemas e vencer os medos são alguns dos conselhos dados por Henzel em seu livro.
- Entre Deus e Messi -
"Agora sou muito mais apaixonado pelo que faço", resume este pai de um garoto de 12 anos, que todos os dias levanta às 6h15 para comandar seu programa matutino na rádio, apresentar outro de tarde e viajar com a Chapecoense para onde a equipe for jogar.
Desde a fatídica madrugada de 29 de novembro, não houve um dia em que Henzel não lembrou do acidente, mas ele tenta evitar o rancor pelo ocorrido e pelo fato de que a tragédia poderia ter sido evitada.
"Tenho a indignação que todos os brasileiros têm, que todo mundo tem, mas Deus não me deixou aqui para ter ódio", afirma.
Henzel repete incansavelmente que é um "milagre de Deus" ter escapado com vida dos escombros do avião, junto com três jogadores da Chapecoense e dois tripulantes.
Naquele dia, Henzel trocou quatro vezes de assento e Lionel Messi acabou salvando sua vida "indiretamente". Com 1,90 m de altura, o jornalista ia se sentar no corredor da penúltima fileira do avião, mas um colega pediu para trocar de lugar, porque aquele assento era supostamente onde o craque argentino teria sentado em outro voo da aeronave. Esse colega faleceu.
"Realmente, essa coisa de Messi é muito impactante para mim", confessa Henzel.
Embora se sinta tranquilo retomando a vida de antes, seu potencial para "coaching" é evidente.
"Nós, os sobreviventes, temos esse dever. Temos que tranquilizar o coração das pessoas. O sofrimento é muito grande, mas a vida está aí", concluiu.

Nenhum comentário:

Postar um comentário