Reconfigure o chip da dor
*por Claudia Queiroz
Parece loucura tornar-se vítima de alguém manipulador ou narcisista… Só que não! É bem mais comum do que se pode imaginar. O que pouca gente sabe é que a cura das sequelas deste mal devastador pode acontecer quando você decide ir além da quebra do espelho.
Não importa se a toxicidade vem de um relacionamento abusivo ou até mesmo de um dos pais narcisista. O chip da dor já está instalado dentro de você. Mas calma, que neste artigo vou tentar iluminar algumas sombras que moram aí dentro e, quem sabe, garantir que reacenda uma chama de amor verdadeiro: o próprio.
O bê-á-bá do amor
Nossa construção emocional começa na infância. Como mãe, hoje sei que educação emocional envolve amar, respeitar, acolher, aninhar, cuidar, nutrir, orientar, proteger, incentivar, conduzir, corrigir, limitar, frustrar, etc. Venho estudando muito sobre maternidade consciente e comunicação positiva, porque realmente acredito que para formar alguém eu preciso não só parecer, mas ser aquilo que digo.
Lapidar a formação de um “serzinho” exige mais que reconhecer a essência individual dele. Não basta dar o comando em casa, é preciso acompanhar cuidadosamente todos os processos do desenvolvimento. Não é de controle que estou falando, mas de estímulos, ações, reações e interpretações. E o melhor, é que para ser uma boa mãe eu ensino a filhota e aprendo com ela a buscar muitas das respostas dentro de mim.
Nossas verdades
Tudo o que acontece na nossa vida é traduzido, de alguma maneira, como verdade para cada um de nós. Somos assim porque vivemos em grupos e queremos pertencer a eles. É uma questão de segurança e troca saudável para a evolução da espécie. Mas acomodamos pensamentos a fim de catalogar experiências de acordo com o que sentimos.
Porém, crianças têm menos recursos para interpretar o que vivencia e, geralmente guarda no inconsciente o que sentiu. Sem orientação quanto a essas emoções, seguem colecionando travas, que no futuro, quando acionadas, terão efeitos devastadores.
Pais que não sabem demonstrar amor, carinho, exercitar a paciência, dedicação do tempo de qualidade juntos, nem validam as emoções dos seus filhos, abreviando momentos de estresse com doces ou brinquedos para distrair, …, estão ensinando essa criança a se distanciar dela mesma, deixando claro que o que ela sente não tem importância alguma. É como se ficassem robotizadas com uma espécie de programação que permite alguns comandos de comportamentos e emoções controlados dentro de uma faixa de horário.
E assim nasce a baixa-estima. Uma sementinha plantada nos pequenos e regada pelo descaso, desimportância e vivenciada pela invisibilidade na família. Essas pessoas que sofrem dentro de casa por não terem voz, nem vez, geralmente são vítimas de bullying na escola e aprendem a se resolver sozinhas, já que ninguém se importa com elas.
Independência triste
Distantes da consciência do gostam e querem da vida, crescem carentes de atenção e aceitando migalhas de afeto. Esse é o padrão arrastado desde a infância, quando uma coisa qualquer estancava aquela necessidade momentânea aguda e o “deixa pra lá, pelo menos me deu alguma coisa” ocupou parte do vazio existencial.
Mesmo que não tenha se dado conta, carência atrai relações abusivas. Quem não aprendeu a amar em casa segue na tentativa de acerto e erro “pela vida a fora, bem sozinha” (lembrei da música da história da Chapeuzinho Vermelho). Abandonou as próprias sensações, afinal não pôde demonstrar na infância o que queria ou gostava mesmo…
A Síndrome da criança boazinha – que para se sentir aceita, não podia incomodar, aborrecer ou chatear os pais. Lembrando que o alarme da educação tradicional (que adestra pessoas menores e amputa emoções) vai tocar mais cedo ou mais tarde.
Sabemos que todo extremo de tensão pode até passar, mas se essa emoção não for devidamente conduzida por adultos preparados, deixa raízes profundas de dor registradas. O corpo não esquece. A essência vai se distanciando da alma e o brilho dos olhos ganha um desconto progressivo de black-Friday sem prazo para terminar.
Reprogramação mental
Não dá pra mudar o passado nem penalizar a educação que recebemos. Ela era adotada pela maioria dos pais na época. Ninguém queria provocar buracos no peito dos filhos! Mas somos adultos e agora temos obrigação de corrigir toda a programação mental que recebemos, assumindo as lacunas e preenchendo com o amor que faltou. Por isso que no início citei que o maior amor do mundo tem que ser o próprio.
Chega de aceitar críticas que te reduzem, achar que não merece as coisas boas da vida e de pensar até que quem convive contigo está fazendo um favor de gostar de você. Enquanto houver eco dentro do seu peito, você irá atrair pessoas com personalidade manipuladora e narcisista. Afinal, é você que continua se colocando como vulnerável na história. Muda essa chave e vira logo essa taça de vida.
Claudia Queiroz é jornalista.
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