segunda-feira, 23 de março de 2015

Prefeitura de Rio das Ostras vence Odebrecht na justiça

Foto: Gabriel Sales
Judiciário reconhece que é válida a Lei Municipal que limita em 15% o comprometimento dos royalties
Rio das Ostras obteve uma vitória significativa na justiça contra a Odebrecht Ambiental, responsável pela Parceria Público Privada - PPP - que opera o sistema de esgotamento da cidade. 

O juiz da 1ª Vara Cível da Comarca de Rio das Ostras, Rodrigo Leal, deferiu nesta segunda-feira, dia 16, favoravelmente ao município, o pedido de Reconsideração formatado pela Procuradoria Geral do Município, revogando a liminar concedida a Odebrecht que suspendia os efeitos da Lei Municipal nº 1890/2015. 

A Lei, publicada no Jornal Oficial nº 728, estipula em até 15% do montante líquido dos repasses de royalties e participações especiais o limite para comprometimento das receitas municipais, tendo em vista a crise econômica e a redução dos valores dos recursos oriundos dos royalties do petróleo. 

Em sua decisão, o juiz alegou que, conforme demonstrado pelo Poder Público, o valor de 10% é destinado a manutenção dos serviços relativos ao esgotamento sanitário, e que o percentual de 15% estipulado pela Lei Municipal visa a prestação de serviço de forma satisfatória, não impedindo a sua execução. 

Outro fator que serviu de base para reconsideração do pedido foi o relatório da Controladoria Geral da União que mostra que o contrato administrativo orçado inicialmente em aproximadamente R$ 250 milhões de reais tenha onerado, ao final, os cofres públicos em mais de 1 bilhão de reais, apontando ainda um sobrepreço de R$ 70 milhões, causando o desequilíbrio econômico-financeiro nos cofres da administração pública. 

De acordo com o Procurador-geral do Município, Eduardo Pacheco de Castro, essa vitória mostra que as medidas tomadas pelo Prefeito Sabino para combater a PPP, assinada em 2007, foram corretas porque ao mesmo tempo em que contestam um contrato absolutamente insustentável, garantem, nesse cenário de crise, a manutenção da prestação de serviços essenciais. "Foi uma grande vitória. Não pode uma única empresa, que já recebeu o dobro do que investiu no município, pretender escravizar a população, impedindo que ela tenha acesso aos serviços básicos", disse. 

Para o prefeito Sabino, essa decisão vai permitir que a prefeitura atravesse esse período de crise de forma menos dramática. "Antes tínhamos a maior parte dos recursos dos royalties, que vêm diminuindo, comprometidos com a PPP. Acreditamos que essa lei, que estipula até 15%, seja uma forma justa de efetuar o pagamento sem comprometer os nossos programas e serviços", falou o prefeito.

Confira a decisão na íntegra

Processo nº: 0002333-85.2015.8.19.0068 Autor: Odebrecht Ambiental - Rio das Ostras S.A. Réu: Município de Rio das Ostras e Outros Decisão Trata-se de ação cautelar proposta pela autora em que busca assegurar o repasse de valores recebidos pela municipalidade a título de royalties do petróleo para o fundo garantidor da parceria público-privada celebrada entre as partes. Decisão de deferimento da liminar às fls. 129 e verso. Pedido de reconsideração da municipalidade às fls. 134/152. É o breve relatório. Passo a decidir. Inicialmente, no que se refere ao disposto nos art. 1º da Lei nº 8437/92 c/c art. 7º, §2º da Lei nº 12.016/09, os quais vedam o deferimento de liminares que acarretem pagamentos de qualquer espécie, normas que foram consideradas constitucionais pelo STF por meio da ADC nº 4, a jurisprudência tem ressalvado que é possível a concessão de medida liminar quando se busca o restabelecimento de benefício previdenciário ou remuneração do servidor público, verbas de caráter alimentar, consoante o julgado abaixo colacionado: AgRg no REsp 1352935 / ES AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 2012/0173722-7 PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. RESTABELECIMENTO DE VANTAGEM PECUNIÁRIA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REQUISITOS AUTORIZADORES. REEXAME DA MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. Controverte-se a respeito do acórdão que confirmou a antecipação de tutela, para que fosse restabelecido o pagamento mensal, à pensionista, do ´Adicional por Tempo de Serviço´. 2. O disposto no art. 7º, § 2º, da Lei 12.016/2009 expressamente disciplina, no Mandado de Segurança, norma de semelhante conteúdo aplicável às demais ações, isto é, o art. 1º da Lei 9.494/1997. Em síntese, veda a concessão de liminar para ´a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza´. 3. Não há razão para deixar de aplicar, por analogia, o entendimento do STJ segundo o qual a lei deve ser interpretada restritivamente, de forma que inexiste vedação à antecipação dos efeitos da tutela, nas ações contra a Fazenda Pública, quando a questão litigiosa tem por objeto restabelecimento de vantagem pecuniária suprimida da folha de pagamento do servidor público. 4. A análise dos requisitos para a concessão da medida, previstos No art. 273 do CPC, implica, como regra, reexame da matéria fático-probatória. Aplicação da Súmula 7/STJ. 5. Agravo Regimental não provido. Nesse contexto, como bem asseverado pelo Município de Rio das Ostras, vislumbra-se óbice de natureza processual ao deferimento da liminar anteriormente concedida, haja vista que a os valores que se pretende sejam repassados ao Fundo Garantidor da Parceria Público-Privada não são de natureza alimentar. Além disso, um dos principais fundamentos da decisão em questão foi assegurar a continuidade do serviço público de saneamento básico prestado pela autora. A esse respeito, tenho que a municipalidade demonstrou de forma clara que o valor devido a título da referida prestação de serviço equivale a aproximadamente 10% do montante pago à autora em relação à contraprestação pecuniária mensal (CPM), como se extrai do disposto na cláusula nº 15.2.2, sendo oportuna a sua transcrição: 15.2.2 - A parcela variável da CPM será de até 10% do valor da COM descrita no item 15.1. acima, determinada segundo nota atribuída ao desempenho da CONTRATADA na execução do objeto do CONTRATO durante o mês correspondente, através da verificação de desempenho e cálculo da NOTA segundo o modelo do Anexo III, do Edital - MODELO DE VERIFICAÇÃO DE DESEMPENHO. Logo, em que pesem as alegações que dizem respeito à constitucionalidade da lei municipal que veio a limitar o montante de repasse das verbas recebidas pelo Município a título de royalties do petróleo, em atenção ao princípio da legitimidade, até que a lei seja declarada inconstitucional, presume-se a sua validade, sendo que a referida limitação em 15% não impedirá a execução do serviço público, assegurada, portanto, a continuidade do serviço público. É fato notório que os municípios da Região dos Lagos e da Baixada Litorânea passam por grave crise financeira em razão da vertiginosa redução dos valores repassados aos entes públicos por conta da crise econômica do país, a grave crise vivenciada pela principal estatal do país, a Petrobrás, e a redução do preço do barril do petróleo, fatos que são hodiernamente noticiados na mídia. Desse modo, é de se verificar que a municipalidade demonstrou que a brusca queda na arrecadação dos royalties do petróleo, assim como a crise econômica vivenciada na região e que afeta toda a indústria petrolífera gerou significativo impacto nas finanças públicas, de modo que a se permitir o pagamento dos valores pleiteados mensalmente pela autora ensejaria ainda maior impacto nas finanças públicas, obstando investimento em áreas prioritárias como saúde, educação, dentre outros, conforme circunstanciado relatório de fls. 153/160. Não se está a simplesmente desconsiderar os termos do contrato entabulado entre as partes, mas diante do quadro fático verificado, impõe-se que a atuação do magistrado, principalmente quando se trata de recursos públicos, se dê de forma extremamente prudente e ponderada, devendo-se, assim, dar primazia ao interesse público do Estado e dos cidadãos do Município frente ao interesse particular da autora. Por fim, merece importante destaque o minucioso e bem fundamentado relatório encaminhado pela Controladoria Geral da União acostado às fls. 162/193, sendo que tal órgão é de reconhecida idoneidade e presteza no exercício de sua função atinente ao controle interno das finanças públicas. Com efeito, é de causar espécie que um contrato administrativo orçado inicialmente em aproximadamente R$ 250.000.000,00 (duzentos e cinquenta milhões de reais) tenha onerado, ao final, os cofres públicos em mais de 1 bilhão de reais, conforme asseverado pela CGU, sendo que de acordo com as contas apresentadas pela municipalidade, o valor total que será pago ao final alcançará o montante de 1,5 bilhão de reais. Ainda que se verifique que nos dois primeiros anos o parceiro privado tenha arcado com a integralidade dos investimentos e que tenha obtido empréstimo junto ao BNDES para financiamento da obra, sendo assim totalmente justificável o repasse dos custos inerentes a tal empréstimo ao parceiro público, não se mostra plausível que a autora tenha um ganho de quase 200% com a referida obra, pois embora tenha tido investimento pouco superior a R$ 300.000.000,00, terá um retorno lucrativo superior a R$ 700.000.000,00, levando-se em consideração, ressalte-se, o prognóstico feito pela CGU, sendo que pelas contas do Município o lucro será superior a 1 bilhão de reais. Ora, embora seja reconhecido que a iniciativa privada, ao contratar com a Administração Pública, muitas vezes encontra entraves, inadimplemento sistemático e grande dificuldade de recebimento do valor devido, haja vista o atual sistema de precatórios, verifica-se no caso que a contratação foi feita através do regime de PPP, o qual é muito mais seguro para o parceiro privado, elemento que reduz de sobremaneira o risco do parceiro privado. Tanto é verdade que nas ocasiões em que houve atraso no pagamento da contraprestação pecuniária o parceiro privado se valeu de mecanismos extremamente ágeis e seguros para obtenção dos recursos, ou seja, notificou a municipalidade e, posteriormente, confirmada a mora, acionou o administrador do Fundo Garantidor para que houvesse o pronto pagamento valendo-se de recursos do aludido fundo. Além disso, o contrato administrativo foi entabulado de tal forma que vinculou parte da receita dos royalties do petróleo ao pagamento da contraprestação, estabelecendo-se repasses sistemáticos de parte dos valores recebidos a tal título por meio do Tesouro Nacional ao Fundo Garantidor, assegurando-se um valor mínimo consignado na conta administrada pelo Banco do Brasil, sendo que é através de tal instituição que há o recebimento dos royalties. Dessa forma, como bem esclarecido pelo autor na inicial, verificando o administrador do Fundo Garantidor que o montante depositado é inferior ao valor mínimo estabelecido em contrato, poderia ele, diretamente, reter parte dos valores pagos como receita de royalties e por ele recebido na condição de instituição financeira por meio da qual o Tesouro Nacional repassa tais valores aos demais entes públicos e integralizar o valor constante do FPPP até perfazer o valor de R$ 27.000.000,00. O que se está a verificar é que o risco do parceiro privado na referida contratação administrativa foi bastante reduzido, o que denota injustificável os juros praticados na hipótese. Além disso, o relatório da CGU apontou ainda que houve sobrepreço na contratação e que, por não ter o parceiro privado executado o projeto tal qual licitado, tal sobrepreço foi estimado em aproximadamente R$ 70.000.000,00 (setenta milhões de reais), sendo oportuna a transcrição do referido trecho: Não obstante, o que se verificou foi que, durante a execução da obra, itens previstos não foram executados ou sofreram alterações em relação ao projeto licitado, resultando em um sobrepreço apontado de cerca de R$ 70 milhões, ressaltando que não foram verificados todos os itens previstos. É de se verificar que o preço estipulado pelo parceiro privado foi de aproximadamente R$ 307 milhões de reais, sendo que o referido sobrepreço corresponde a aproximadamente ¿ do montante total contratado, devendo-se destacar que a CGU sequer avaliou todos os itens previstos e destacou que não obteve informações precisas sobre o acompanhamento das obras, pois o Poder Público não realizou medições regulares e substanciais, relatando que havia dificuldade na apuração desses dados, com o que se conclui que o prejuízo pode ser ainda maior do que o estimado pela CGU. Em acréscimo a isso, o relatório apontou que houve superestimativa de preços em relação aos quantitativos de obras e serviços efetivamente necessários para consecução do objeto, como se extrai do que asseverado à fl. 179: Para o caso em tela, observamos a existência de quantitativos de serviços e obras constantes nas memórias de cálculo acima dos valores efetivamente necessários para a execução do objeto. Observamos, ainda, a ocorrência de alterações de especificações idênticas que, conjuntamente com a superestimativa de serviços anteriormente citada, causou o desequilíbrio econômico-financeiro em desfavor da administração pública. Além disso, o relatório da CGU apontou graves falhas no processo licitatório, levantando severas suspeitas sobre direcionamento da licitação ao se estabelecerem requisitos que se mostraram desproporcionais e que ensejaram redução significativa na competitividade, restringindo de sobremaneira o universo de empresas que poderiam concorrer ao pleito, valendo mais uma vez transcrever parte das conclusões da CGU no caso: Com relação ao processo licitatório para a contratação das obras, foram verificadas ofensas aos princípios constitucionais da igualdade e competitividade dos licitantes contrárias aos ditames da Lei de Licitações, que juntamente com fragilidade no acompanhamento da execução das obras, contribuíram para o não cumprimento das metas propostas. Portanto, por verificar que há óbice processual para o deferimento da liminar ora pleiteada, inexistindo no caso risco de dano irreparável na medida em que está assegurada a continuidade do serviço público por meio do repasse de 15% do valor recebido a título de royalties do petróleo ao Fundo Garantidor e, por fim, em razão das gravíssimas irregularidades apontadas na contratação em tela, sendo que permitir o integral repasse dos valores poderá gerar grave comprometimento das finanças públicas, assim como maximizar ainda mais os prejuízos da Administração Pública com a Parceria Público-Privada em questão, REVOGO A DECISÃO de fls. 129 e verso e, por conseguinte, INDEFIRO A DECISÃO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. Como a municipalidade já compareceu espontaneamente ao feito, o que supre a necessidade de citação, na forma do art. 214, §1º do CPC, ao réu para apresentar contestação no prazo legal. Intimem-se. Diante da gravidade dos fatos e presença de interesse público, dê-se vista ao MP. Rio das Ostras, 16 de março de 2015. Rodrigo Leal Manhães de Sá Juiz de Direito

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