sábado, 27 de dezembro de 2014

PT pressiona por mais espaço à esquerda no novo ministério

27/12/2014 17:01
Por Redação - de Brasília

A presidente Dilma RousseffA presidente Dilma Rousseff
A presidente Dilma Rousseff tem percebido uma ação mais incisiva do PT à esquerda
Longe de representar uma divisão na legenda que conquistou o Palácio do Planalto, nas últimas eleições, a formação do ministério da presidenta reeleita, Dilma Rousseff, tem levado o Partido dos Trabalhadores (PT) a uma reflexão mais acurada de seu papel no conjunto de forças políticas que integrarão a base aliada ao governo, a partir do dia 1º de Janeiro. Em uma análise, o jornalista Breno Altman, diretor de Redação do site Opera Mundi, após considerar a fragilidade do apoio parlamentar à presidenta, aponta a existência de uma clara tentativa de um novo golpe midiático:
“Importantes veículos de comunicação apostam abertamente em transformar a investigação na Petrobrás em carro-chefe de operação que leve à paralisia e ao desgaste da presidente, se possível a seu impedimento”, afirma Altman.
A nova composição do ministério e a disputa por espaço político também guardam novos episódios nos quais quem ganhou e quem perdeu, nas urnas, buscam definir, com nitidez, o contorno de suas aspirações. PT fluminense, que já indicou o deputado Alessandro Molon à secretaria de Comunicação Social, também teria levado o nome do deputado Chico D’Angelo para um posto ainda não definido na Esplanada dos Ministérios.
Lula distante
Enquanto descansa no litoral baiano, a presidenta Dilma tem ouvido, cada vez mais distante, a voz rouca de seu mentor político. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, diferentemente de 2010, quando fez questão de participar, ativamente, da montagem do governo, tem deixado mais espaço livre para sua pupila. Lula, com todas as letras, afinou seu discurso na direção da esquerda, distanciando-se dos acordes liberais que ora se ouvem nos ministérios da Fazenda, com a indicação de Joaquim Levy – de voto declarado aos tucanos – e Kátia Abreu (PMDB-TO), a senadora do agronegócio. Na dúvida, Dilma deixou para segunda-feira o anúncio dos ministeriáveis petistas.
Em novembro, logo após o fechamento das urnas, Dilma consultou Lula, que emplacou Nelson Barbosa no Ministério do Planejamento, mas depois seguiu seu caminho, após engolir a escolha de Levy.
Ex-líder sindical, Lula tem recebido frequentes visitas de integrantes da Central Única dos Trabalhadores (CUT), maior central sindical do país, que organiza o ato político em Brasília, para o dia da posse da presidente Dilma Rousseff. Outras centrais sindicais e movimentos sociais, como os sem-terra do MST, já confirmaram presença.
A manifestação já é um ato concreto da “reorganização” das esquerdas, defendida pelo ex-presidente. Os ativistas da CUT e dos demais movimentos sociais; além de comemorar a vitória, repudiam as tentativas de desestabilizar o governo eleito.
O ato público tende a cobrar coerência da presidenta Dilma com o seu posicionamento durante a campanha:
“Reiteramos nossa posição contra propostas de ajuste fiscal contrárias ao programa que venceu as eleições presidenciais”, diz o documento que convoca para a manifestação no dia da posse. A CUT também reprovou a elevação da taxa de juros adotada pelo Banco Central, como “ineficaz” para o combate à inflação.
Em um vídeo, distribuído pelas redes sociais, Lula defendeu a reforma política como fator imprescindível, a começar pelo fim da lista de partidos e do financiamento público. Para ele, nos próximos quatro anos, é essencial ainda reorganizar a base de aliança do governo, que sofreu perdas desde que chegou ao poder, com setores mais à esquerda da sociedade.
– Nós temos que tirar as lições da dureza desse processo eleitoral. Nós temos que saber que uma próxima eleição vai ter que se dar numa outra lógica política, porque a reforma política tem que permear a vontade do PT, a vontade dos partidos que querem mudar a lógica política desse país – disse o ex-presidente.
Pacificação
Ainda segundo o artigo do jornalista Breno Altman, “abundam analistas e protagonistas elogiando as escolhas da presidente para o ministério, as medidas anunciadas nas últimas semanas e o discurso que tem predominado desde a reeleição. A ideia-força que atrai estes aplausos é a da pacificação. Seria lance político de brilhantismo um conjunto de concessões destinadas a desarmar o clima de enfrentamento da disputa presidencial”.
“O portfólio de providências inclui, entre outras iniciativas, aumentos seguidos da taxa de juros, nomeação de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda, oficialização de ferrabrás do ruralismo para a Agricultura, abertura prevista de capital da Caixa Econômica Federal e crescimento dos agrupamentos centristas no novo gabinete, com esvaziamento relativo do PT. Para muitos, tiro certeiro: estariam sendo criadas as condições de repactuação com as classes dominantes, refazendo alianças e isolando eventuais segmentos golpistas”, acrescentou.
Na análise do jornalista, “os partidos de esquerda não terão, no Congresso a ser empossado daqui a dois meses, mais do que um quinto das cadeiras. Na outra ponta, as legendas mais reacionárias ampliaram fortemente sua presença. A base de apoio parlamentar está dividida e desorganizada. Porção relevante do centrismo, especialmente abrigada no PMDB, apoiou o PSDB nas eleições presidenciais e está decidida a fazer de Eduardo Cunha o novo presidente da Câmara dos Deputados, associada à oposição de direita”.
“A leitura aparentemente predominante, em círculos governistas, é que estes e outros fatores seriam suficientes para recomendar uma estratégia-violino: venceu-se com a mão esquerda, mas para governar torna-se necessário tocar com a mão direita; acredita-se, em contrapartida, que os inimigos desistam de assaltar o instrumento confiado às forças progressistas pelo voto popular. Na pior das hipóteses, ganharia-se tempo até os bons ventos da economia mundial voltarem a soprar, restaurando a hipótese de seguir adiante com as melhorias sociais sem radicalização do conflito distributivo”.
O articulista, porém, cita “duas ordens distintas de problemas, nesta formulação”.
“A primeira reside em saber se é possível conciliar estas concessões, de magnitude ainda pouco clara, e mesmo que provisórias, com o processo iniciado em 2003, cujos fundamentos são a construção do Estado de bem-estar, a distribuição de renda e a consolidação do mercado interno de massas como força propulsora do desenvolvimento. Se a resposta for negativa, cresceriam os riscos do petismo cair em cenário de paralisia ou retrocesso nas conquistas sociais. As consequências políticas, como não é difícil prever, poderiam ser dramáticas”, disse.
Altman afirma, ainda, que “vale lembrar que as poderosas realizações dos últimos 12 anos foram incapazes de evitar que se criasse clima para manifestações de protesto, em junho de 2013, e de oferecer tranquilidade eleitoral no último pleito. Caso a alternativa ao esgotamento do primeiro ciclo de reformas seja, mesmo moderadamente, na direção oposta das políticas até aqui praticadas, haveria notáveis possibilidades de esgarçamento da confiança no projeto encabeçado pelo PT”.
Capitulação
A segunda “ordem de obstáculos”, questiona o diretor de Redação, “é ainda mais perigosa: e se o apaziguamento fracassa?”
“O núcleo duro das classes dominantes, afinal, já deixou bastante claro que as reformas de cunho orçamentário, que não alterem estruturas de poder e riqueza, são as fronteiras de sua tolerância natural. Para além disso, somente se oligarquias do capital forem subjugadas ou derrotadas. No mais, a história está cheia de exemplos sobre como pode ser inócua e traiçoeira, em determinadas situações políticas, a prevalência da conciliação sobre o enfrentamento”, alerta.
Altman cita o ex-presidente Getúlio Vargas, que teve seu nome inscrito “entre conciliações malogradas”:
“Isolado no parlamento, compôs gabinete de centro-direita para neutralizar a oposição golpista. A manobra foi um retumbante fracasso. Perdeu apoio popular, ao aplicar parte do programa liberal de seus adversários, e viu-se no dever de entregar a vida, só assim reavivando o entusiasmo das ruas, para impedir a morte de seu projeto político”.
A disposição com que Dilma marcha à direita, afirma o jornalista, deixa claro “que forças de esquerda e movimentos sociais, com papel decisivo no segundo turno das eleições, estão perplexos e irritadiços com as decisões tomadas pela presidente. Seria ilusão acreditar que se possa manter a simpatia deste lado da sociedade apenas com frases e informações alarmistas sobre a ameaça de tudo ficar pior, se a presidente não receber solidariedade incondicional diante da escalada conservadora”.
“Caso predomine sentimento de frustração e apatia nestes setores, que constituem a alma mater do petismo e da esquerda, quem estará ao lado do palácio nas horas difíceis que virão?”, pergunta-se o jornalista
“Que forças impediriam a direita de querer transformar a dieta de concessões em regime de capitulação? Há forte expectativa, nestas circunstâncias, para o discurso de Dilma no próximo dia 1º de janeiro. A pergunta que não pode calar: com qual mão ela carregará o arco do violino ao subir no parlatório de sua segunda posse e dali em diante?”, conclui.

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