terça-feira, 29 de abril de 2014

Brasil: Escola Naval abre as portas para mulheres

Por Nelza Oliveira para Infosurhoy.com
As primeiras 12 vagas da instituição de ensino superior mais antiga do país foram disputadas por 3.355 mulheres interessadas em fazer carreira como oficiais da Marinha.
 
 
     
TAMANHO DO TEXTO  
Pela primeira vez, a Escola Naval tem mulheres no curso de formação de oficiais da Marinha. (Renzo Gostoli/Austral Foto for Infosurhoy.com)
Pela primeira vez, a Escola Naval tem mulheres no curso de formação de oficiais da Marinha. (Renzo Gostoli/Austral Foto for Infosurhoy.com)
RIO DE JANEIRO, Brasil – Elas são apenas 12 entre 867 homens.
Mas essas 12 aspirantes representam um marco histórico na Escola Naval. Esta é a primeira vez que a instituição de ensino superiormais antiga do país abre as portas para o sexo feminino no curso de formação de oficiais da Marinha.
“Sempre sonhei em ser militar”, diz a primeira colocada no concurso, a cearense Jéssica Custódio, 20 anos, durante evento de apresentação das novas aspirantes, em 2 de abril. “Eu sempre dizia que, se um dia abrissem vaga para mulheres, eu me inscreveria.”
A disputa pelas vagas foi acirrada. Um total de 3.355 candidatas de todo o país participou do Concurso Público de Admissão à Escola Naval, ou seja, 279,5 mulheres por vaga. Os requisitos básicos eram ter idade entre 18 e 23 anos, ser solteira, sem filho e com o segundo grau completo.
“A preparação foi bem puxada. Abandonei tudo para me dedicar ao concurso”, diz a carioca Rebeca Ferreira, 19, que se inspirou no exemplo do irmão, do tio e do avô, todos militares.
Além de provas escritas, homens e mulheres passaram pelos mesmos testes de aptidões físicas e avaliação médica.
“A única diferença que as mulheres tiveram na parte física foi a possibilidade de fazer flexões com o joelho apoiado no chão”, lembra Jéssica, cujo pai é cabo do Exército.
A Marinha foi a primeira das três forças militares do país (Marinha, Exército e Aeronáutica) a aceitar mulheres, há 33 anos, com a criação do Corpo Auxiliar Feminino. De acordo com a necessidade da corporação, elas eram admitidas por concursos públicos, já com suas devidas formações técnica ou superior.
Elas passavam, então, por um curso de adaptação para atuar na Marinha. Não havia possibilidade de ascensão aos postos máximos. Elas alcançavam no máximo a função de capitão de fragata. Em 1997, A Marinha extinguiu o Corpo Auxiliar Feminino e distribuiu as mulheres entre os quadros regulares da corporação. Assim, elas passaram a ter possibilidade de acesso às mesmas funções que os homens.
Em 2012, a capitã-de-mar-e-guerra Dalva Maria Carvalho Mendes foi promovida ao posto de contra-almirante médica e se tornou a primeira mulher a ocupar um cargo de oficial-general das Forças Armadas no Brasil.
As 12 aspirantes da Escola Naval são as primeiras a entrarem sem formação prévia e com a oportunidade de saírem graduadas em nível superior como oficiais da marinha.
“Houve um preparo intenso em relação aos aspirantes e oficiais que as receberam aqui, não só em questões de normas do curso, mas também em termos de liderança, convivência e trato com o sexo feminino”, explica o Comandante do Corpo de Aspirantes da Escola Naval, Capitão Rocha Martins.
A Escola Naval passou por adaptações na estrutura. Foram feitos novos alojamentos, banheiros femininos, leito feminino na enfermaria e lavanderia. Câmeras de vídeo e alarmes foram instalados nos corredores e entradas dos alojamentos das aspirantes.
“Assim como é uma adaptação para gente, é uma adaptação para eles”, diz Jéssica. “Mas há um respeito mútuo muito grande.”
A formação da nova turma será para atuação no Corpo de Intendência, em questões logísticas, financeiras e administrativas. Os outros dois Corpos de formação da Escola – em áreas consideradas combatentes, Armada (para atividades a bordo de navios) e de Fuzileiros Navais (ações da tropa em terra) – continuam restritos aos homens.
No entanto, homens e mulheres de qualquer Corpo cumprem a mesma rotina de estudos e exercícios físicos. Somente no segundo ano do curso, que tem duração de quatro anos, os aspirantes são separados.
Todos acordam às 6h e vão dormir às 22h. O regime é de internato, com saída permitida apenas nos fins de semana.
Apesar do grande esforço, a saudade da família parece ser o que mais incomoda as jovens.
“Sinto muito falta das minhas irmãs”, diz Thais Oliveira, 18, de Brasília.
Elas buscam conforto na convivência com as novas colegas.
“Somos bem unidas e contamos umas com as outras”, diz Rebeca.
As aspirantes seguem um código de posturas rígido, que inclui cabelos curtos ou presos, maquiagem discreta e brincos menores que o lóbulo da orelha.
“Acho importante se arrumar e usar maquiagem, até porque o uniforme tira um pouquinho da nossa feminilidade”, diz Thais Afonso dos Santos, 22. “A gente não deixa de ser mulher aqui dentro.”
No fim do curso, as participantes serão declaradas guardas-marinha e partirão para uma viagem de seis meses por países das Américas e da Europa.
Após o regresso, serão nomeadas 2º tenentes e irão exercer atividades nas diversas bases da Marinha.
“O ingresso de mulheres é um passo importante que será avaliado”, diz o comandante da Escola Naval, Vice-Almirante Antônio Carlos Soares Guerreiro. “Vamos analisar o resultado dessa primeira turma depois de cinco anos para ver o desempenho e pensar em ampliar o número de vagas ou ampliar a participação em cursos para outros Corpos.”
Nos próximos cinco anos, serão abertas 12 vagas para mulheres a cada ano, segundo o comandante.
Apesar de representarem apenas 6,34% do efetivo, a presença feminina nas Forças Armadas brasileiras é cada vez maior. Há atualmente 22.208 militares mulheres, sendo 5.815 na Marinha, segundo o Ministério da Defesa.
A presidente Dilma Rousseff sancionou em agosto do ano passado a Lei nº 12.705, que permite o ingresso de militares do sexo feminino em áreas antes restritas aos homens no Exército.
Ainda assim, a presença feminina continua maior em setores administrativos e nos serviços médicos e odontológicos. Na Força Aérea Brasileira (FAB), que possui o maior número de militares do sexo feminino em seus quadros (9.927), elas atuam em posições de combate, como mulheres pilotos de caças e helicópteros.
Questionada sobre os sonhos para o futuro, Rebeca dá uma resposta que parece ser unânime entre as aspirantes: “Quero ser uma das primeiras almirantes formadas pela Escola Naval”.
Agora, só depende delas.
Veja mais fotos aqui.

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